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sábado, 26 de janeiro de 2019

Até quando? A tragédia de um mecanismo mal desenhado

Por Cristiano Oliveira


Fonte: Estado de Minas
Diante das lamentáveis tragédias ambientais que vem ocorrendo na história recente do Brasil tenho observado uma busca por culpados. Embora infelizmente se note que pessoas tentem utilizar uma situação grave como esta em que várias vidas foram perdidas para benefício próprio e/ou político, acredito que a “culpa” é da nossa incapacidade de gerar os incentivos corretos para evitar que situações como esta ocorram. Enquanto isto não for mudado, tragédias como estas continuaram infelizmente ocorrendo. Mais uma vez a solução está na Análise Econômica do Direito, em especial, no livro indicado na foto.
De forma muito resumida existem 3 formas de evitar que crimes como estes ocorram.
1-Proibir a atividade econômica
2-Exigir uma licença prévia que preveja estruturas de precaução e ter um arcabouço regulatório que exija ações de precaução
3-Responsabilidade pela negligência ou responsabilidade total
A opção 1 é a mais radical e gera perdas de bem-estar, pois, a atividade econômica gera emprego, renda e lucro, que aliás, não é um pecado. Nesse momento, cabe salientar, que estes eventos não ocorrem porque empresas maximizam lucros. Toda empresa maximiza lucro. Todos os indivíduos maximizam os seu bem-estar, mesmo quando são altruístas. Repito: o problema está nos incentivos mal desenhados.
A opção 2 é mais comum. Todavia, não podemos esquecer que o nível de precaução é algo dinâmico. A empresa pode até prever em seu projeto estruturas e ações que garantam a precaução, mas, nada garante que estas ações serão mantidas após a obtenção da licença ou que a estrutura construída é suficiente. Pois, vale lembrar que os níveis de precaução são definidos por agentes estatais, que podem ser influenciados pelas empresas para que sejam muito baixos. Além disso, a fiscalização nem sempre é eficaz. Isto porque em algumas vezes os custos de monitoramento são muito altos e em outras vezes os agentes estatais são simplesmente corrompidos pelas empresas. Logo, é fácil observar que a opção 2 por definição é insuficiente para incentivar o nível de precaução ótimo. Em palavras mais simples, não perca o seu tempo culpando os fiscais, eles são agentes racionais que também reagem a incentivos e mudar os incentivos deles, não vai resolver o problema. A opção 2 é o mecanismo perfeito para proliferar a corrupção. Neste contexto, por estas razões, em geral, há uma combinação com a opção 3.
Quando a opção 2 e 3 são combinadas, a regra é a de negligência, ou seja, a empresa somente é responsável pelos danos se ela descumpriu alguma das regras que estabeleciam estruturas e ações de precaução. Caso ela tenha cumprido todas as exigências, não há responsabilização. Neste modelo, não há garantia de que o nível ótimo de precaução será atingido porque lembre que quem definiu estas regras é um agente estatal que provavelmente sofreu influência da própria empresa. Nesta situação fica no ar uma sensação de impunidade, mas, o judiciário normalmente apenas cumpre aquilo que esta previsto nas regras.
Neste contexto, existem algumas alternativas. A combinação das opções 2 e 3 podem até funcionar, mas, não com este modelo atual. A fiscalização estatal pode ser complementada/substituída por uma legislação que preveja whistleblowing e false claim act (procure no Google o que são estas instituições😉).
Do ponto de vista teórico a única forma de garantir o nível de precaução ótimo é a de responsabilidade total. A empresa é responsável por todo e qualquer dano causado por ela. E diante de um crime (de saúde pública, ambiental, etc..) a punição incluirá a indenização de todos os outros agentes prejudicados, multas por danos ao meio ambiente e algum tipo de punição aos responsáveis pela empresa, que pode inclusive prever algum tipo de pena de reclusão.
Com a responsabilidade total, as licenças prévias podem ser substituídas por um seguro obrigatório. Uma forma mais eficiente de se garantir o nível de precaução ótimo, uma vez, que a negligência identificada por uma empresa privada (de seguros) resultaria em pagamentos mais altos pelo seguro.
É claro que para que a responsabilidade total funcione é necessário um judiciário eficiente. Acredito que isto é mais factível do que seguir com este modelo de Estado interventor, em que são exigidas licenças prévias complementadas com fiscalização. Não acredito que o executivo (Estado) seja capaz de fazer isso como a sociedade espera, uma vez que podemos observar muitos exemplos da sua incapacidade, que talvez só fique evidente em tragédias como esta que estamos presenciando.

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